Revista Capital Aberto – Dezembro / 2016
Por André Pimentel
Imagine um cenário em que você ficasse doente, o sistema de saúde negasse atendimento, não houvesse acesso a medicamentos, e até mesmo os amigos e as pessoas próximas se afastassem com medo do risco que você representaria. Parece um absurdo. Entretanto é isso que acontece hoje com empresas quando, por algum motivo, se desestabilizam financeiramente.
Em qualquer ambiente capitalista saudável, empreender - não apenas no sentido de criar, mas também no de dar continuidade a uma atividade econômica - é a base do desenvolvimento e da geração de riqueza. Também é consenso que existe um elevado grau de risco nisso, pois significa agir em cenário dinâmico, influenciado por grande numero de variáveis sobre as quais, em linhas gerais, não exercemos controle direto.
E é exatamente em função dessas duas características que se procuram construir regras e instrumentos para auxiliar àqueles que têm coragem de empreender, mas que por algum motivo se deparam com grandes dificuldades. Isso fortalece a confiança dos empreendedores no processo de empreender. Mais importante: cria as condições adequadas para que aqueles que queiram participar de reestruturação de empresas sigam regras claras e tenham segurança, administrando apenas o risco empresarial relacionado ao próprio negócio.
Não é o que acontece hoje no Brasil. Empresas em dificuldades, e que estejam passando por um processo de reestruturação, tem uma vida cada vez mais difícil. São marginalizados, ficam sem praticamente nenhum apoio dos agentes econômicos e são postas de lado para se virar sozinhas no momento de maior fragilidade.
Praticamente todas as fontes de captação de recursos financeiros regulares desaparecem ou se tornam inviáveis. Quando ainda possíveis, na maioria dos casos, vão agravando progressivamente a situação, pois são desenhadas para “salvar” no curto ou curtíssimo prazo e não fazem parte de um plano duradouro sustentável. Os grandes bancos são os primeiros a cortar as linhas de crédito que em momentos de bonança estão fartamente disponíveis. Bancos de médio porte, ou mesmo empresas de fomento mercantil estão mais abertos a uma relação risco / retorno que recompense a manutenção das suas linhas de crédito, mas custos crescentes inviabilizam essas fontes, além de contribuir para o agravamento da situação, pois são puramente paliativas.
E a possibilidade mais saudável nesses casos – a entrada de novos e comprometidos investidores – encontra diversas barreiras. Hoje no Brasil é raro encontrar um investidor que queira continuar a conversa quando percebe que a empresa enfrenta problemas. Não que esteja errado, pois é real a dificuldade de interromper um ciclo negativo com regras atuais (ou a falta delas) e um risco real de ser “dragado” junto com o problema, em vez de ser visto como um agente de solução.
Praticamente todos os instrumentos para isso, como a Lei de Recuperação Judicial, ainda estão pouco maduros ou são passíveis de interpretações e interferências por uma justiça que ainda não entende, nem se preparou para tratar disso adequadamente.
A falta de atratividade ao investidor complica, e muitas vezes impede, a recuperação das empresas. É muito difícil convencê-lo a apoiar o projeto com o capital necessário, mesmo quando existe um plano que todos acreditam viável e existem as condições de obter requisitos de governança adequados. Quem perde com isso é a dinâmica econômica e os diversos stakeholders, ou seja, toda a sociedade.